fonte:Lusa -27 Out 2012
António Lobo Antunes com “muita pena de viver num país onde as pessoas vivem de maneira horrível”
O escritor António Lobo Antunes disse hoje “gostar cada vez mais de ser português, mas sentir “raiva” por estar num país onde as pessoas “vivem de maneira horrível e sem esperança”.
O escritor António Lobo Antunes disse hoje “gostar cada vez mais de ser português, mas sentir “raiva” por estar num país onde as pessoas “vivem de maneira horrível e sem esperança”.
“Tenho muita pena que tudo se passe numa altura em que os portugueses estão a viver numa maneira horrível, sem esperança, com tanta insensatez e tanta imaturidade”, afirmou, acrescentando: “Enraivece-me viver num país onde senhoras chegam ao pé de nós, nos olham de frente e dizem baixinho: tenho fome”.
António Lobo Antunes falava hoje, em Penafiel, numa conferência do festival literário Escritaria que está a homenagear o escritor.
Olhando para as centenas de pessoas que o ouviam e aplaudiam no auditório do museu municipal, o autor agradeceu o carinho e a ternura com que foi recebido naquela cidade do distrito do Porto.
“O que acaba por ser uma coisa muito boa dos livros são os amigos desconhecidos”, observou.
O escritor admitiu que estava com “a maior hesitação” em participar no Escritaria, ao mesmo tempo que recordava ter rejeitado receber vários prémios literários.
“Vim e foi uma surpresa. Comoveram-me as pessoas que trabalharam com generosidade e um calor humano que não posso esquecer”, disse, emocionado.
António Lobo Antunes olhou para o presidente da Câmara de Penafiel, Alberto Santos, que estava sentado ao seu lado, e, pausadamente, insistiu nos elogios ao Escritaria e à cidade:
“Estava cheio de medo de Penafiel, pensava que fosse como aqueles subúrbios horríveis de Lisboa e do Porto. Esta cidade é tão bonita e as pessoas são simpáticas, agradáveis e quentes”.
Antes, os jornalistas Fátima Campos Ferreira e Mário Crespo, convidados pela organização, falaram da admiração que têm por António Lobo Antunes e do medo que sentiram quando entrevistaram o escritor.
“Senti medo de não estar à altura”, disse a jornalista da RTP, recordando “os gestos lentos, a voz funda e as palavras certeiras do escritor”.
Já Mário Crespo, da SIC, disse ter sentido “medo dos silêncios” de António Lobo Antunes e da “conversa difícil e desconcertante” com um escritor que, disse,” retrata a nossa contemporaneidade como ninguém o faz atualmente”.
Maria Luísa Blanco, diretora editorial do Museu Nacional Centro de Arte Rainha Sofia, em Espanha, considerou que os livros de António Lobo Antunes são “epopeias que obrigam o leitor a abdicar da sua racionalidade”.
O advogado Miguel Veiga, amigo pessoal do homenageado, disse apreciar muito a ironia de António Lobo Antunes, por ser “a suprema forma do conhecimento”.
A académica Alzira Sanches referiu-se aos livros de António Lobo Antunes como “a grandeza da obra, a perfeição da escrita e o domínio da composição do romance”. Entre os elogios ao escritor, acrescentou: “É a linguagem da obra-prima do sortilégio da poesia”.
Jeff Gordon Love, professor universitário norte-americano, considerou que António Lobo Antunes há muito deixou de ser “apenas um escritor português”, lembrando que os seus livros são lidos e discutidos em todo o mundo.
Na edição deste ano do Escritaria, António Lobo Antunes apresentou a sua obra mais recente “Não é Meia Noite Quem Quer”.
O escritor admitiu que aquele é, entre os seus livros, o que gosta mais.
“Gostei muito de o escrever. Foi um milagre para mim”, afirmou, na sexta-feira, em conferência de imprensa.
Nas anteriores edições do Escritaria, foram homenageados os escritores Urbano Tavares Rodrigues, José Saramago, Agustina Bessa – Luís e Mia Couto.